Vermilhas, na encosta da Serra do Caramulo, recebe-nos de braços abertos, com a singularidade e a franqueza que carateriza as suas gentes. Aqui, o tempo parece parar, perpetuando as tradições rurais e culturais que marcaram sucessivas gerações de habitantes que honraram e continuam a honrar a terra que lhes serve de berço. Esse legado chega-nos, também, pelo esforço e dedicação do Rancho Folclórico de Carvalhal de Vermilhas e, de forma particular, através da família de Isabel Moita e dos seus pais, Helena Tojal e José Moita.

A Binaural Nodar recorda este testemunho recolhido em maio de 2016, e, de uma forma singela, presta homenagem, a título póstumo, a José Moita, agradecendo-lhe a generosidade das suas palavras.

Salsa da beira do rio (2x)
Alecrim da outra banda (2x)
Eu hei de amar os teus olhos (2x)
Antes que eu corra demanda. (2x)

As ceifas do centeio, o ritmo dos manguais a bater nos molhos, as sementeiras, as sachas, a poda, as vindimas… O ciclo dos trabalhos agrícolas marcava o calendário dos dias no mundo rural. Vermilhas, “terra de gente dada”, não fugia à regra, relata-nos José Moita.

Rogava-se um grupo de pessoas e os cantares – associados às ceifas ou às malhas – surgiam de forma natural. “Não quer dizer que o trabalho fosse bom. Mas era alegre”, recorda, sem esquecer os bailes com que se terminavam os dias árduos.

Perto dos 80 anos, sente os dias da vida a minguar pela janela da aldeia onde nasceu, onde sempre viveu, guardando boas memórias, apesar dos tempos difíceis.

Formou a sua própria família, com seis filhos – dos quais apenas os últimos dois, gémeos, não nasceram em casa, como era prática – e requalificou a casa que era dos pais.

A pecuária era um setor de grande importância para a comunidade, contribuindo para a economia local. José Moita lembra-se de haver 140 vacas, mas já só restam oito. “A serra está abandonada e não há ninguém que trabalhe na agricultura. Nem compensa”, explica, notando que nunca foi um setor rentável.

O gado bovino era usado para trabalho e carne, sendo as parelhas presas com o jugo e as molhelhas, dado que “seguravam melhor o carro” pelos caminhos ruins da serra.

Os currais eram cobertos com giestas e palha centeia, que foram sendo substituídos por telha. No chão, ficava o tojo e também a giesta para fazer o estrume que se usava para fertilizar, de forma mais saudável, as terras. Como ficavam perto dos terrenos, garante José Moita, que Vermilhas era a povoação mais limpa na serra e nem havia moscas.

Cada povoação tinha um touro de cobrição para assegurar a procriação. À feira de Oliveira de Frades, a cada 15 dias, vinham negociantes de várias regiões, incluindo do Porto, e faziam-se os negócios. Por mês, 20 ou 30 vitelos saíam da aldeia e era disso que os habitantes viviam.

José Moita já só mantém duas vacas, uma de 2003 e outra de 2007, que continuam a sair quase todos os dias para o pasto.

Os tempos mudaram e os campos já ficam parados. No seu caso, “vai fazendo alguma coisa porque não sabe fazer mais nada.

A caça foi outra das suas paixões. Durante 54 anos, viveu-a de forma intensa e percorreu o país com perdizes, pombos bravos e coelhos na mira. Houve uma época, realça, em que foi, durante três meses, todos os fins-de-semana para o Alentejo. “Era uma farturinha”, brinca, garantindo que “valia a pena”.