A mãe, de Vouzela, e o pai, com raízes em Viseu e São Pedro do Sul, foram ainda jovens para Lisboa. Foi aí que nasceu João Vale de Andrade, o mais velho de quatro irmãos, atualmente com 62 anos.

Com uma edução pautada pela compreensão e condescendência, a família manteve a ligação a Lafões, onde vinha com frequência, nas alturas mais comuns – Páscoa, Natal e duas ou três semanas em setembro – ficando alojada na casa da avó, em Vouzela. Chegando pela estrada do Vale do Vouga ou vindo pelo Buçaco, a viagem demorava entre cinco e seis horas, com uma refeição pelo meio.

Em 1974, Vale de Andrade tinha 13 anos e frequentava a Escola Fernando Pessoa, que tinha acabado de abrir com um “Ensino Experimental”, que viria a dar origem ao sistema educativo unificado.

Dadas as boas relações do pai, licenciado em Farmácia e em Direito, que tinha sido Procurador do Ministério Público e Chefe de Gabinete de Antunes Varela, ministro da Justiça do Estado Novo, “em casa havia informação” e “já se falava de que poderia acontecer qualquer coisa”. A falhada Revolta das Caldas e o lançamento do livro do General Spínola “Portugal e o Futuro” antecipavam o que iria acontecer.

Apesar de os pais terem tido conhecimento das primeiras movimentações, ainda de madrugada, a família não alterou a rotina, mas o dia 25 de abril fugiu à normalidade. Na escola, habitualmente com uma vigilância apertada e com o porteiro e os auxiliares fardados, notava-se “alguma coisa estranha”, sem controlo de entradas e, sem qualquer explicação, ausência de algumas aulas.

“Foi um dia engraçado, em que o tema fez parte das conversas”, conta, acrescentando que o seu grupo de amigos ainda tentou ir para o centro nevrálgico dos acontecimentos, sem sucesso porque os transportes não estavam a circular.

Já no Liceu D. Dinis, onde ainda funcionava o antigo regime educativo, João Vale de Andrade viveu uma atividade política intensa e anos atribulados. Entre greves e lutas, assistia-se aos movimentos reivindicativos juvenis e ao encerramento dos estabelecimentos de ensino quando não havia condições de segurança.

O responsável recorda o boicote, em 1975, às visitas e colaboração no trabalho nas Unidades Coletivas de Trabalho, no Alentejo, que levou à retenção de oito alunos, incluindo a sua, quando houve passagem administrativa a nível nacional.

A instabilidade vivia-se ainda no bairro onde a família residia, com situações de tensão entre militares. No seu prédio morava, inclusivamente, o inspetor Pereira de Carvalho, o número dois da PIDE, que acabaria detido.