Documento integrado no projeto “O espírito da colmeia”, um projeto artístico de Manuela Barile que partiu de uma investigação etnográfica sobre a apicultura na aldeia de Várzea de Calde. Sendo o mel usado como alimento desde os alvores da civilização, foi interessante perceber como uma comunidade situada num contexto ambiental de grande diversidade ao nível da flora autóctone se especializou ao longo dos tempos na produção de produtos derivados da criação racional de abelhas (várias subespécies de Apis mellifera) como o pólen apícola, o própolis, a cera e o próprio mel.

Herculano Gonçalves nasceu na aldeia de Várzea, freguesia de Calde (concelho de Viseu) a 24 de Junho de 1941. Apesar de a apicultura ser atualmente um passatempo, iniciou esta atividade por volta dos anos oitenta, não só pelo gosto que tem pelo mel, mas também pelas próprias abelhas. Este gosto foi-lhe provavelmente transmitido pelo seu avô que já antigamente tinha colmeias: “e isso é um bichinho que já nasce com as pessoas. Portanto, gosto muito de ter o meu pequeno apiário”.

Herculano Gonçalves descreve o modo como as abelhas trabalham e do que fazem quando saem de uma colmeia, para o apicultor as apanhar. Falou ainda da importância que elas representam para o nosso ecossistema: “É um bem muito grande para a humanidade, porque se não fossem as abelhas, não havia fruto depois. Elas é que vêm polinizar as plantas”. Explica-nos ainda que, apesar de noutras povoações haver quem faça “transumância” de abelhas, ou seja, a mudança de sítio dos apiários conforme a florestação, na sua aldeia não existe esse hábito. Em Várzea de Calde, as terras são essencialmente ricas em urze, fazendo com que a principal característica do mel produzido seja a sua cor mais escura.

Herculano Gonçalves descreve o processo de trabalho anual de um apicultor, no entanto garante que, salvo algumas exceções, “não se deve andar a mexer muito, quanto mais se mexer às vezes é pior”. Em meados de outubro, princípios do mês de novembro, diz ser a altura ideal para ver “como é que as colmeias ficam de mel” no ninho já que as alças já foram retiradas. Através desta verificação e adição de novos quadros de uma colmeia para outra, diz ser possível garantir a sobrevivência do enxame que durante o inverno é mais pequeno e se alimenta conforme suas necessidades.

Entrevista realizada por Manuela Barile em 11 de setembro de 2018. Edição audiovisual de Manuela Barile.