“Novas Expressões do Território” é uma exposição audiovisual concebida pela Binaural Nodar em 2019 para a Programação Cultural em Rede da Comunidade Intermunicipal de Viseu Dão Lafões, a qual partiu de um conjunto de criações artísticas realizadas a partir de recolhas efetuadas em paisagens e junto de comunidades dos referidos catorze municípios da região, fluindo temáticas e narrativas que propõem dimensões poéticas, não literais, do património cultural local.

ARISTIDES DE SOUSA MENDES
Cabanas de Viriato, Carregal do Sal

Artistides de Sousa Mendes
Um homem imperfeito
contraditório, de alma saturnina
a quem a história bateu à porta,
mais do que o contrário,

Tal destino calhou a alguém nascido na lusitana aldeia de Cabanas de Viriato, concelho de Carregal do Sal.

Pouco antes e pouco depois da meia-noite do dia 19 de julho de 1885, nasceram dois bebés, Aristides e César.
Dois rebentos de um família católica e monárquica,
parte da aristocracia rural das terras beirãs a sul de Viseu
(aquelas do vinho do Dão, das grandes quintas e melhores famílias).
Imaginemos o rodopio das empregadas em redor da parteira: ai que já nasceu um e falta o outro.
Que Deus proteja estes anjinhos.

Os dois rebentos cresceram e, dizem em Cabanas, que brincavam com os meninos do povo e frequentaram a escola local, a mesma daqueles de tamancos e sopas de azeite, pão e vinho. Quiçá a heterodoxia que foi revelando Aristides ao longo da vida germinou nestes anos entre a casa do Passal e o odor a fumeiro das famílias de caseiros.

Da placidez beirã a vida de Aristides foi acelerando. Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, casamento com a amiga de infância e prima Maria Angelina, catorze filhos, carreira diplomática e consequente itinerância.

A guerra, essa nuvem que não escolhe o momento ao ser soprada por aqueles para quem a paz é nervosa, apanhou Aristides como cônsul diplomático na Bélgica e o seu costumeiro hábito de trocar as voltas ao habitual, o que tantas vezes gerou incómodos, tornou-o nesta ocasião num herói improvável.

Aristides, o homem que diziam ser perturbado.
Aristides, aquele que se encerrava no quarto dias a fio, em estado de profundo desespero.
Aristides, o mesmo que passou vistos a eito a filhos de Israel, talvez centenas, talvez milhares, para que rumassem de Portugal até às terras da América do norte e do sul, escapando à incerteza do que aí viria e veio mesmo.
Artistides, o que casou em segundas núpcias com a irascível belga Andrée
Aristides, o que regressou a Cabanas de Viriato, derrotado, em conflito consigo mesmo, com a sua família e com os poderes, vendendo móveis, arrancando ripas do soalho para se aquecer, uma a uma, até à morte.

Anos passaram.
O destino dessa esventrada casa do Passal,
às vezes habitada por caseiros,
outras vezes lugar de esconderijos da canalhada da aldeia,
acaba por ser uma improvável homenagem às vidas deixadas para trás por aqueles judeus a quem Aristides concedeu o veredicto da errância.

Gente com apelidos como Aisenberg, Aronowicz, Barbouth, Benjamin, Berghauer, Bernfeld, Cohn, Eichel, Eisler, Ekstein, Elias, Foundaminsky, Galimir, Gingold, Greizerstein, Grunfeld, Hartogs, Holzer, Ipekdjian, Jacobi, Josefsberg, Klopper, Kurow, Lapinere, Levy, Lustig, Maotti, Mantinoff, Nadja, Perlmutter, Pfeffer, Rittermann, Rubin, Salomon, Sazonoff, Schapiro, Segall, Sokal, Stakgold, Stern, Tanne, Tuteur, Weiss, Wilder, Wiznizer, Zabludowski e Zalman.

Ficha Técnica
Conceito original: Luís Costa
Registos sonoros e vídeo originais de Luís Costa, Manuela Barile, João Farelo, Liliana Silva e Rui Costa
Edição vídeo: Liliana Silva
Edição sonora, textos e voz: Luís Costa
Concepção do percurso expositivo: Luís Costa e Liliana Silva
Ilustrações: Liliana Silva
Produção executiva: Diana Silva